Resultado da curadoria das histórias – A Lenda na Cena 2024
Sertões de Pernambuco
SERTÃO DE ITAPARICA
TACARATU
1 - O Furo no Pé do Lobisomem
"Minha mãe contava que há pouco mais de um ano - e é verdade! - minha bisavó furou o pé do lobisomem.
Esse lobisomem era do Brejo de Baixo, e minha bisavó, que morava só, contava que ele ficava de olho nos filhos dela. Um dia, o homem que virava lobisomem disse a ela:
- Vou visitar você mais tarde...
Então ela pegou um ferro e levou para o padre benzer. Ela ia receber a visita, mas pelo menos ia estar protegida. Quando chegou a noite, o lobisomem bateu na porta, mas ela já estava esperando. Ele começou a empurrar a porta e quando ele começou a entrar ela já enfiou o ferro benzido no pé do lobisomem e ele foi-se embora com o pé machucado!
No outro dia, todo mundo descobriu quem era o lobisomem, porque o homem passou a andar mancando e de pé furado. Dizem que ele mancou até o fim da vida… E não foi um padre qualquer que benzeu o ferro, não! O ferro foi benzido por Padre Cícero, e dizem que está guardado em algum lugar no Brejo até hoje!"
2 - O Assobiador
“Quando vamos caçar no meio do mato, às vezes a gente ouve um assobio, ou uma voz… Dizem que é o Assobiador, um protetor da mata. E todo mundo sabe: quando ouvir ele, não é pra continuar a caçada, é pra voltar, porque se não pode ficar ariado* ou pode dar errado.”
* Ariado significa perdido ou distraído. É um dialeto popular nordestino que se refere a quem está desorientado e não sabe o que fazer ou para onde ir.
3 - Burro em Pé
“Eu estava indo buscar umas fotos na casa da minha amiga, e de lá íamos buscar limão no pé. Quando a gente tava no caminho, perto de um cajueiro tinha um bicho que parecia um burro, só que ele estava em pé. Eu perguntei se minha amiga tava vendo também, e ela estava paralisada, impressionada. Então eu dei um tapa nela, sai correndo e ela veio correndo atrás. A gente correu tanto que os pés batiam na cabeça! Quando a gente chegou em casa, trancou tudo, se deitou e ficamos lá a noite toda, com muito medo.”
4 - A Pedra que rolava
"Quando meu avô era mais novo, em tempo de chuva a Serra do Brejo ficava cheia de neblina, mas ele descia mesmo assim. Quando ele tava descendo a ladeira, uma pedra estava rolando atrás dele, mas quando ele olhava pra trás a pedra parava. Quando ele voltava a andar, a pedra voltava a rolar. Ele ouvia a pedra, mas não a via. A pedra nem chegava perto e nunca alcançou meu avô!”
5 - Leonor
“Uma menina jovem, em tempo de menstruação, não podia comer um certo tipo de ave, pois senão, ela seria carregada. Mas mesmo assim ela comeu.
Dias depois ela começou a criar penugem! Chamaram os mais velhos para rezarem, mas eles disseram que ela era uma bruxa, e então colocaram ela em uma caverna e a fecharam com uma pedra. Tempos depois foram ver se havia os restos mortais lá e não encontraram nada. Depois disso toda vez que alguém, passava por lá, gritava:
- Bora, Leonor!
E ela respondia:
- Me espera que já vou!
Mas não tinha nada nem ninguém lá, ela já tinha se encantado…”
6 - Aposta
“Era uma vez uma velha e um velho. Certo dia, logo cedo, fizeram uma aposta. Cozinharam três ovos e o acordo foi:
- Quem não falar, come dois ovos e quem falar, come um só.
O velho ficou na porta de casa e a velha na cozinha. O pessoal passava na porta, cumprimentava o velho e ele calado. Ele ficou de 7 horas da manhã até meio dia sem falar nada, e a velha continuava na cozinha. O velho ficou cansado de esperar, deitou na calçada e dormiu. O compadre passou, deu bom dia, e nada. Então, entrou e foi falar com a velha na cozinha:
- Cumadre, acho que o velho bateu as botas, ele não fala mais nada…
A velha saiu de casa e disse:
- Apois, não é que ele não morreu mesmo?
O velho na hora mexeu os pés. E assim, o velho ganhou a aposta, comeu dois ovos e a velha só um “.
7 - O homem de uma roupa
"O homem namorava e só tinha uma roupa. Todo dia saia com a mulher com a mesma roupa. Um dia esse homem tinha um jantar marcado na casa dos pais da mulher. Como o tempo era pouco, ele lavou sua roupa, mas a roupa não secou. Ele chegou no jantar com a roupa toda molhada e a mulher disse:
- Tire essa roupa, vou arrumar uma do meu irmão para você!
O homem não aceitou. A noite foi passando até que chegou a hora de dormir. Sem ter muitas opções de lugares na casa, o homem foi dormir na cozinha. Ele estendeu sua roupa, que ainda estava molhada, em um lugar próximo do fogo onde eles faziam a comida. Ele agarrou no sono e o vento balançava a roupa... Quando amanheceu, cadê a roupa? O fogo comeu!
Quando o pessoal acordou não tinha ninguém, o homem havia saído correndo sem roupa pela rua.”
8 – As Caboquinhas da Água
“Lá embaixo tem uma mina de água, no lajedo. Ali moram as Caboquinhas d’Água, que são as entidades da nossa espiritualidade, a Jurema. Elas gostam muito das meninas, então ela se encanta pelas meninas e dá quebrante* nelas. Antigamente as meninas iam tomar banho, recebiam o quebrante nelas e depois morriam. Elas achavam elas tão bonitas, mas tão bonitas, que queriam só para elas.”
* Quebrante é uma crença popular brasileira que se refere a uma energia negativa que pode afetar a saúde e o bem-estar de uma pessoa. É também conhecido como mau-olhado ou olho gordo..
9 – Cajueiro das Almas
“Antigamente só tinha cemitérios na cidade, então quando precisavam enterrar ou velar alguém, o pessoal da aldeia precisava ir até a cidade. Tinha o cajueiro onde o pessoal parava para descansar, tomar água, café… e paravam o morto nesse lugar também. Nesse cajueiro, um galho ficava rodando, todos os outros ficaram parados e só ele rodando. Isso acontecia geralmente às 6 horas da noite. Hoje em dia tiraram esse cajueiro. Dizem que não por medo, mas porque estava atrapalhando o caminho das pessoas.”
10 – O Vulto
“Meu tio vinha bêbo* montado no cavalo. Quando ele olhou para o lado, ele viu um vulto branco se balançando. Com ele estava armado, ele começou a atirar nesse vulto e correu. Chegou na casa de minha avó assombrado, contando o acontecido, dizendo que tinha gente atrás dele.
O dia amanheceu e foram lá para ver o cadáver. Chegando lá, era um cabo de estopa pendurado no cajueiro.”
*bêbado